Por Elisabetta Recine e Ana Carolina Feldenheimer*

Membros da Aliança em reunião com o diretor de Regulação da Anvisa, Renato Porto.

Na última quarta-feira de fevereiro (28/02), membros da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, representantes de movimentos e organizações da sociedade civil da área da saúde e nutrição, estiveram reunidos com o Diretor de Regulação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Renato Porto.

A reunião teve como objetivo esclarecer o processo de revisão da regulação da rotulagem nutricional e o papel da Diretoria de Regulação neste processo. No encontro, Porto afirmou que a participação da Diretoria adicionará a análise de impacto regulatório, garantindo que a decisão da Agência se dê considerando, prioritariamente, a perspectiva técnica e científica do tema.

Foram solicitados esclarecimentos ao Diretor a respeito dos prazos para a análise dos estudos sobre entendimento, por parte da população, das diferentes propostas de rotulagem que foram entregues à Anvisa e das próximas etapas, incluindo a consulta pública. Porto ponderou que ainda não avaliou o processo e, portanto, não tem uma posição tomada. É importante lembrar que quando relator do processo histórico de regulação das informações sobre alergênicos nos rótulos de produtos e bebidas industrializados, ele colocou-se em defesa do direito à informação como instrumento dos consumidores para escolhas conscientes e informadas.

Se existe um consenso entre os atores envolvidos na discussão da rotulagem é de que atualmente as embalagens mais confundem do que informam o consumidor. A pergunta que se coloca, então, é: se temos elementos consistentes para aprimorar a rotulagem, por que ainda não o fizemos? Quais são os interesses que atrasam estas medidas? Até quando milhões de consumidores que frequentam diariamente os mercados comprarão alimentos industrializados sem as informações que necessitam para fazer escolhas  informadas? E de quem é a responsabilidade pela situação de desrespeito ao direito básico à informação?

Do lado da indústria, sabemos que o que norteia seus interesses não é a defesa da saúde pública, afinal, são eles que produzem a maioria dos produtos que hoje são os responsáveis pelo aumento global dos casos de excesso de peso e de doenças crônicas como diabetes e hipertensão. Produtos cujo consumo é estimulado pelos milhões de reais em publicidade que promove atributos que induzem escolhas alimentares que comprometem a saúde da população, especialmente a das crianças.

Uma decisão no Brasil que coloque a saúde pública em primeiro lugar em detrimento de outros interesses elevará o país a uma condição de referência mundial no controle das doenças crônicas não transmissíveis. Permitindo que as pessoas possam fazer escolhas conscientes sobre o seu consumo, a Anvisa reafirma e reforça seu mandato em defesa da saúde pública. Por outro lado, uma decisão que mantenha a desinformação promovida pela indústria de alimentos não só será amplamente questionada e seus motivos escrutinados, como jogará água no moinho da perda de legitimidade regulatória da Agência.

A Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável participa dos debates sobre rotulagem nutricional e já apresentou diversos estudos que comprovam a eficácia e superioridade do sistema de alertas nas embalagens, mas está consciente de que  não é a panaceia para a resolução dos problemas de saúde. De forma complementar, defendemos outras medidas que vão desde a adoção de alimentação saudável nas escolas, políticas de desestímulo ao consumo de bebidas adoçadas, restrições da publicidade de produtos danosos à saúde, educação alimentar e nutricional e outras que ampliem a produção, disponibilidade, acesso e consumo de alimentos  adequados e saudáveis.

*Elisabetta Recine é professora do Departamento de Nutrição da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade de Brasília e presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Consea) e Ana Carolina Feldenheimer é professora do Departamento de Nutrição Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Ambas fazem parte do Comitê Gestor da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável.

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