30/04/2021 - Blog Manifestos
A Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável enviou carta neste dia 30 de abril ao governador de São Paulo João Dória manifestando repúdio em relação a possível nomeação dos candidatos João Dornellas, da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (ABIA) e Amanda Araujo Pinto, da Sociedade Rural Brasileira como presidente e vice-presidente do Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional Sustentável (Consea-SP).
Na carta, a Aliança denuncia que as organizações não são sociedade civil, e também o conflito de interesses envolvidos na participação de setores que representam os interesses comerciais das grandes indústrias de alimentos e de grandes proprietários de terras. O documento também foi enviado ao Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, deputado estadual Carlão Pignatari, à coordenadora da Frente Parlamentar pela Reforma Agrária, Agricultura Familiar, Segurança Alimentar e Regularização Fundiária Rural, deputada Márcia Li, e à Coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa da Produção Orgânica e da Agroecologia, deputada estadual Monica da Bancada Ativista.
“As indústrias de alimentos possuem interesses privados, e não tem demonstrado comprometimento com as políticas públicas focadas em saúde. Desta forma, não podem ser qualificadas como instituições que tenham uma contribuição pública na área de segurança alimentar e nutricional. No momento em que a fome assola grande parte da população devido a pandemia, a presença destes atores em posições tão estratégicas e estruturantes representa uma forte ameaça ao cumprimento do Plano Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional, vigente até 2023”, afirma a carta. O texto conclui reforçando a importância da indicação de atores da sociedade civil que defendem interesses públicos para ocupar os cargos de presidente e vice-presidente, “para que o Consea Estadual possa de fato cumprir os seus objetivos”.
Diversas organizações e redes da sociedade civil estão mobilizadas pelo tema. Esta semana, também foram enviadas cartas de repúdio pela comissão organizadora da Conferência Popular por Direitos, Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional e também pelos presidentes dos CONSEAs estaduais da Região Sudeste – Espírito Santo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.
Leia abaixo a íntegra da carta da Aliança:
São Paulo, 30 de Abril de 2021.
Ao Sr. João Doria
Governador do Estado de São Paulo
gabinetedogovernador@sp.gov.br
C/C:
Deputado Estadual Carlão Pignatari– carlaopignatari@al.sp.gov.br
Presidente da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo
Deputada Estadual Márcia Lia – marcialia@al.sp.gov.br
Coordenadora da Frente Parlamentar pela Reforma Agrária, Agricultura Familiar, Segurança Alimentar e Regularização Fundiária Rural
Deputada Estadual Monica da Bancada Ativista – mandata.ativista@al.sp.gov.br Coordenadora da Frente Parlamentar em Defesa da Produção Orgânica e da Agroecologia
Assunto: Manifestação sobre a indicação da lista tríplice para a presidência do Consea – SP.
Senhor Governador,
Reconhecemos que o governo do Estado de São Paulo tem priorizado a saúde no combate à pandemia e resistido às pressões de setores na retomada da economia e diante disso, vimos como uma incoerência a possível nomeação de representantes de grandes indústrias e produtores de alimentos para compor o Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional do Estado de São Paulo (Consea-SP). Trata-se do órgão mais estratégico e fundamental para a adoção de políticas e ações baseadas em evidências científicas de mitigação e recuperação da expansão dos índices de insegurança alimentar no Estado.
Diante do resultado da eleição realizada no dia 14 de abril de 2021 para a lista tríplice para presidência e vice-presidência do Consea-SP, manifestamos o repúdio da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável em relação a possível nomeação dos candidatos João Dornellas, representante da ABIA para presidente e Amanda Araujo Pinto, representante da Sociedade Rural Brasileira como vice-presidente.
A Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável é uma coalizão de organizações e pessoas que trabalham defendendo políticas públicas e medidas regulatórias para o alcance do direito humano à alimentação adequada e saudável. Diversos membros da Aliança acompanham e são membros de Conselhos de Segurança Alimentar e Nutricional e Conselhos de Alimentação Escolar pelo Brasil afora, pois consideramos esses espaços estratégicos e fundamentais para a construção de políticas efetivas, com a participação de atores da sociedade civil que defendem os interesses públicos.
Conforme previsto no Regimento Interno do Consea SP, o cargo de presidente do Consea possui atribuições estratégicas e fundamentais para a garantia do funcionamento do Conselho, incluindo: supervisionar e acompanhar todas as atividades do Conselho; baixar os atos necessários ao exercício das tarefas administrativas e não administrativas ao conselho; tomar decisões de caráter urgente “ad referendum” do conselho; exercer o voto de desempate; deliberar sobre quaisquer outras atividades que lhe couber; instalar as Câmaras Permanentes, Grupos de Trabalho e as Comissões Regionais de SAN, empossando o coordenador e demais membros, conforme deliberado em Plenário; decidir sobre questões de ordem; delegar competências.
Diante dessas atribuições e dos conflitos de interesses envolvidos na participação de setores que representam os interesses comerciais das grandes indústrias de alimentos e de grandes proprietários de terras, a nomeação desses atores comprometerá o cumprimento das atribuições do Conselho e ameaça ainda mais o monitoramento e avaliação do 1o Plano Paulista de Segurança Alimentar e Nutricional 2019-2023 (PLANSAN/SP), construído democraticamente, traduzindo os anseios da população paulista em um conjunto de ações e metas de governo com o objetivo de garantir e efetivar uma Política Pública de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) para o estado.
O PLANSAN/SP é indispensável para a realização de outros direitos humanos consagrados no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da Organização das Nações Unidas (Comentário Geral n.º 12/1999 – Comitê PIDESC do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU). Cabe ao Estado respeitar, proteger, promover e prover o DHAA. A articulação intersetorial das Políticas de SAN num Plano estratégico representa uma potente ferramenta ao gestor na garantia deste direito constitucional aos cidadãos, os quais lhe delegaram o mandato público. Ainda, o PLANSAN/SP prevê ações para superar desafios relacionados ao combate da covid-19 no que diz respeito a garantia de alimentação adequada e saudável para população, conforme detalhado nos macro objetivos do plano, chamados de “desafios”, com destaque para: Desafio 1 – Promover o acesso universal à alimentação adequada e saudável, com prioridade para as famílias e pessoas em situação de insegurança alimentar e nutricional; Desafio 2 – Combater a insegurança alimentar e nutricional e promover a inclusão produtiva rural em grupos populacionais específicos, com ênfase em povos e comunidades tradicionais e outros grupos sociais vulneráveis no meio rural; e Desafio 4 – Promover o abastecimento e o acesso regular e permanente da população brasileira à alimentação adequada e saudável.
Para além dos desafios colocados no PLANSAN/SP, é importante destacar as condições estabelecidas no Artigo 17 do Decreto 7.252/2010 quanto ao funcionamento dos Conseas para assegurar a participação social, incluindo: a obrigação de observar os critérios de intersetorialidade, organização e mobilização dos movimentos sociais em cada realidade, no que se refere à definição de seus representantes; estabelecer mecanismos de participação da população, especialmente dos grupos incluídos nos programas e ações de segurança alimentar e nutricional, nos conselhos e conferências; e manter articulação permanente com as câmaras intersetoriais e com outros conselhos relativos às ações associadas à PNSAN. Diante de tais obrigações, os representantes da ABIA e da Sociedade Rural Brasileira não estão em posição legítima de representação dos interesses dos grupos populacionais mais vulneráveis. A ABIA e a Sociedade Rural Brasileira não são “sociedade civil”.
As indústrias de alimentos possuem interesses privados, e não tem demonstrado comprometimento com as políticas públicas focadas em saúde. Desta forma, não podem ser qualificadas como instituições que tenham uma contribuição pública na área de segurança alimentar e nutricional. No momento em que a fome assola grande parte da população devido a pandemia, a presença destes atores em posições tão estratégicas e estruturantes representa uma forte ameaça ao cumprimento do Plano Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional, vigente até 2023.
É neste contexto que a Aliança reforça a importância da indicação de atores da sociedade civil que defendem interesses públicos para ocupar os cargos de presidente e vice-presidente, para que o Consea Estadual possa de fato cumprir os seus objetivos.
Atenciosamente,
Núcleo Nacional da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável
Membros do Núcleo:
Ana Carolina Feldenheimer da Silva – Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Elisabetta Recine – Observatório de Políticas de Segurança Alimentar e Nutrição/ Universidade de Brasília (OPSAN/UnB)
Glenn Makuta- Slow Food
Inês Rugani – Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO)
Janine Giuberti – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec)
Lucas Daniel Sanches – Instituto Desiderata
Nayara Cortes – FIAN Brasil
Paula Johns – ACT Promoção da Saúde