Brasil bateu recorde de liberação de agrotóxicos em 2024
Segundo o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), foram aprovados 663 produtos, um aumento de 19% em relação a 2023, quando foram liberados 555 produtos (Foto: Freepik)
Houve um aumento de 19% no número de agentes, defensivos e ‘bioinsumos’ liberados no ano passado; estudo do Idec identificou traços de agrotóxicos em biscoito maisena, macarrão instantâneo e produtos à base de plantas

O Brasil bateu recorde de liberação de agrotóxicos em 2024, segundo informações do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Foram 663 produtos aprovados, um aumento de 19% em relação a 2023, quando foram liberados 555 produtos. Naquele ano, houve redução no número de liberações. 

Segundo reportagem do Brasil de Fato, a maioria dos novos produtos aprovados são genéricos de outros agentes já liberados (541). Quinze novas substâncias foram aprovadas, assim como 106 produtos de origem biológica, os chamados “bioinsumos”.

A nova lei dos agrotóxicos, além de encurtar os prazos de análises dos produtos, retirou da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) o poder de veto sobre a liberação dessas substâncias, cabendo a essas instituições apenas a classificação de risco dos produtos.

Desta forma, a decisão passa a estar concentrada no Ministério da Agricultura, que já se manifestou publicamente contra qualquer medida que vise a redução do uso de agrotóxicos no Brasil. 

Entre as novas substâncias liberadas para uso no Brasil, duas receberam a categoria 2 na classificação toxicológica da Anvisa, como “altamente tóxico”. 

O Orandis, produto a base de Clorotalonil e Oxatiapiprolim, atua como fungicida e é indicado para pequenas culturas. Já o Miravis é um composto de Clorotalonil e Pidiflumetofem. Também atua como fungicida e é usado em grandes cultivos de soja, milho, algodão e trigo. Ambos são produzidos pela Syngenta.

Segundo informações dos fabricantes, a inalação dos produtos pode levar a óbito, além de provocar reações alérgicas e lesões oculares em caso de exposição indevida. 

 

Nossa comida está envenenada  

A liberação massiva de substâncias químicas para uso agrícola se reflete na qualidade da alimentação dos brasileiros e tem consequências graves à saúde. Os resultados do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para) no ano de 2023, realizado pela Anvisa, revelaram que cerca de 26% dos alimentos consumidos pelos brasileiros possuem resíduos de agrotóxicos no momento do consumo. E desses resíduos, pelo menos cinco possuem restrições e proibições em outros países, incluindo o Carbendazim, que tem uso proibido no Brasil desde 2022.  

Apenas nas amostras de arroz, foram encontrados 25 agrotóxicos tipos diferentes de agrotóxicos. Já no abacaxi, foram identificadas 31 substâncias residuais, entre elas, o glifosato, ingrediente ativo proibido em diversos países da União Europeia, a partir de estudos que o relacionam com a incidência de diversos tipos de cânceres.  

 

E tem mais veneno nos pacotes

De 24 alimentos ultraprocessados produzidos no Brasil, com destaque para aqueles com apelo ao público infantil, foram encontrados resíduos de agrotóxicos em metade das amostras.

O número alarmante está no terceiro volume da pesquisa “Tem Veneno Nesse Pacote”, realizada pelo Instituto de Defesa de Consumidores (Idec) e que identifica a presença de resíduos de agrotóxicos em produtos alimentícios ultraprocessados comuns na rotina dos brasileiros. 

O estudo está disponível gratuitamente na página idec.org.br/veneno-no-pacote, juntamente com os dois primeiros volumes, lançados em 2021 e 2022. 

Na terceira edição, divulgada no ano passado, foram analisados 24 ultraprocessados de oito categorias: macarrão instantâneo, biscoito maisena, presunto cozido, bolo pronto sabor chocolate, sobremesa petit suisse sabor morango, bebida láctea sabor chocolate, hambúrguer à base de plantas e empanado à base de plantas com sabor de frango. 

Em cada categoria, foram selecionados os três produtos mais vendidos do mercado. Os testes foram realizados por um laboratório certificado pela Coordenação Geral de Acreditação (CGCRE) do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro), credenciado junto ao Ministério da Pecuária e Abastecimento (MAPA) e utilizado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) em testes de resíduos de agrotóxicos. 

O teste escolhido é um dos mais abrangentes, com capacidade de detectar resíduos de até 563 agrotóxicos diferentes. 

A coordenadora do Programa de Alimentação Saudável e Sustentável do Idec e integrante da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, Laís Amaral, explica que as categorias com produtos à base de plantas foram incluídas no estudo mais recente em razão do avanço da indústria, que se apropria de uma fatia do mercado considerada “novidade”, apresentada como alternativa ao consumo de carne, enquanto vende uma variação dos mesmos ultraprocessados de sempre, e ainda utilizando matérias-primas produzidas com o uso de agrotóxicos.

“Precisamos alertar para o perigo duplo do consumo de ultraprocessados. Eles são produtos com excesso de nutrientes críticos, relacionados ao desenvolvimento de doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes, doenças do coração e hipertensão, além da presença de aditivos alimentares. E também temos consistentemente encontrado traços de contaminação com agrotóxicos nesses produtos, ou seja, são venenos tão potentes que continuam ali mesmo depois dos processos de produção nas indústrias”, explica Amaral. 

Com a finalização do volume 3 do estudo “Tem Veneno Nesse Pacote”, o Idec enviou notificações para todas as empresas responsáveis pelos produtos analisados em que foram encontrados agrotóxicos. Os dados também foram enviados à Anvisa.

Com informações do Brasil de Fato e do Idec. 

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