Alimentos ultraprocessados já representam mais de 20% da ingestão calórica dos moradores das grandes cidades do Brasil – Foto: gpointstudio/Freepik
Da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, com informações do Jornal da USP

 

Enquanto cidades menores e de regiões rurais consomem menos ultraprocessados, a participação desse tipo de produto alimentício na dieta dos moradores de grandes cidades e capitais é muito mais significativa e preocupante: ultrapassa 20% da ingestão diária de calorias, passando de 30% em alguns casos.

É o que indica uma pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP-USP), que estimou a participação calórica dos ultraprocessados na dieta dos moradores dos 5.570 municípios brasileiros. Os resultados foram publicados em artigo na Revista de Saúde Pública, com autoria do pesquisador de pós-doutorado Leandro Cacau. 

O estudo considerou a porcentagem de calorias provenientes de ultraprocessados em relação ao total de calorias consumidas por um indivíduo ou população. No Brasil como um todo, a média de participação calórica de alimentos ultraprocessados é de 20,2%. 

Como sabemos, o consumo excessivo de ultraprocessados está ligado ao aumento de doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes, doenças cardiovasculares e alguns tipos de câncer. 

A grande discrepância pode ser exemplificada comparando Aroeira do Itaim (PI), com 6% de participação dos ultraprocessados, e Florianópolis (SC) com mais de 30%. 

As estimativas de participação calórica de alimentos ultraprocessados foram mais altas nos municípios da região Sul, especialmente naqueles do estado de Santa Catarina, onde todos os municípios apresentaram estimativas acima de 20%. No Paraná, as estimativas variaram de 16% no município de Antônio Olinto a 26,3% em Curitiba. No Rio Grande do Sul, as estimativas variaram de 17,6% no município de Coqueiro Baixo a 26,6% em Porto Alegre.

No Sudeste, os municípios do estado de São Paulo apresentaram as maiores estimativas, com a capital chegando a 25,5%. Por outro lado, os municípios do estado do Espírito Santo apresentaram as menores estimativas da região, com a capital Vitória apresentando 16,7%. 

O estado de Minas Gerais destacou-se como um dos estados com as estimativas municipais mais heterogêneas na região, com Frei Lagonegro atingindo 13,8% e, no outro extremo, os municípios Nova Lima e Belo Horizonte atingindo 20,9% e 22,8%, respectivamente. Os municípios do estado do Rio de Janeiro apresentaram estimativas variando de 15,2% para São José de Ubá a 22,4% na capital.

No Centro-Oeste, os municípios de Goiás apresentaram as menores estimativas da região, sendo a mais alta registrada na capital Goiânia (19,4%). Brasília foi o município com maior média de participação calórica de alimentos ultraprocessados na região, atingindo 22,6%. Mato Grosso destacou-se como o estado com maior heterogeneidade nas estimativas dos municípios da região, variando de 13,0% em Barão de Melgaço e Porto Estrela a cerca de 18,0% em Campo Novo dos Parecis, Várzea Grande e Cuiabá.

No Nordeste, os estados cujos municípios apresentaram as menores estimativas foram, em ordem crescente, Piauí, Maranhão e Paraíba. O estado da Bahia destacou-se por apresentar municípios com as maiores estimativas da região, com todos acima de 16,0% e a capital Salvador alcançando 25,7%.

Os municípios do estado de Tocantins apresentaram as menores estimativas de participação calórica de alimentos ultraprocessados da região Norte, com a mais alta sendo na capital Palmas, que alcançou 12,2%. 

Os estados de Roraima e Rondônia apresentaram estimativas intermediárias na região. O município de Cantá, em Roraima, apresentou estimativa de 9,25% e o município de Novo Horizonte do Oeste, em Rondônia, de 9,46%, enquanto as capitais apresentaram estimativas de 15,6% e 16,6%, respectivamente. Os municípios dos estados do Pará e Amapá, por sua vez, apresentaram as maiores estimativas da região.

Modelo estatístico para os 5.570 municípios

Com um modelo estatístico de predição, a estimativa de participação de alimentos ultraprocessados desses municípios teve base nos dados do Censo Demográfico de 2010 e em 46 mil indivíduos maiores de dez anos participantes da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2017-2018 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A média de consumo foi maior em pessoas do meio urbano que do rural, e nas capitais em relação aos demais municípios. 

A participação considera a porcentagem de calorias provenientes de ultraprocessados em relação ao total de calorias consumidas por um indivíduo ou população, e a pesquisa revelou uma grande discrepância entre os Estados do Brasil. 

Utilizando um modelo estatístico, a pesquisa extrapolou os dados para as cidades sobre as quais não havia informações disponíveis, gerando um mapa detalhado do consumo no Brasil. Para estimativa da média em função das características – como sexo, idade, renda, escolaridade, raça/cor, e localização geográfica – os pesquisadores utilizaram a regressão linear múltipla, método para prever valores com muitas variáveis. 

“Utilizamos esse modelo estatístico para poder extrapolar os resultados que temos da Pesquisa de Orçamentos Familiares. Depois, avaliamos se essa fórmula que criamos estava certa ou tinha algum erro, utilizando também métodos estatísticos, com os resultados positivos”, explica Cacau. 

Uma limitação reconhecida do estudo é o fato do censo utilizado ser referente a 2010; para contorná-la, um fator de correção foi aplicado. “Esse fator de correção foi construído com base no consumo preciso de alimentos ultraprocessados medido nas capitais e no Distrito Federal, onde entrevistadores avaliaram diretamente as pessoas. Esse dado foi considerado o nosso referencial”, continua.

No Brasil como um todo, a média de participação calórica de alimentos ultraprocessados é de 20,2%. Em comparação com homens, a média das mulheres foi maior, embora diminua com o aumento da idade e aumente conforme nível de escolaridade e renda. Apesar do enfoque na dimensão quantitativa, uma análise qualitativa é necessária para entender o porquê dessas diferenças.

Para a Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável, pesquisas como esta podem ajudar a definir políticas públicas e ações localizadas para valorizar não apenas o Direito Humano à Alimentação Adequada e programas como as cozinhas solidárias, como também as iniciativas de produtores locais, da agricultura familiar e regional e de cuidado com a saúde. 

Fonte: Mapa da má alimentação revela participação de ultraprocessados na dieta dos brasileiros

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