Acredite na magia. Mas não acredite que a Coca-Cola não anuncia para crianças

22/12/2017 - Notícias

POR: MARIANA FERRAZ

Olhinhos brilhantes de crianças extasiadas com a visita do Papai-Noel no sertão nordestino. Um vilarejo perdido no tempo e no espaço, onde até então não se sabia, nem se havia ouvido falar do bom velhinho. Para uma menina, ele era bem pequenininho, como um duende. Para o rapazinho, talvez viesse de camelo e vestisse azul. Ele mora na “Betânia”? O “coiso”? Esse tal de papai noel. E a vida segue na brincadeira de bola-de-meia e cinco-marias com pedrinhas do chão seco do sertão.

Eis que então, radiante e triunfante, numa noite feliz, chega o caminhão da Coca-Cola, com luzes piscantes e música retumbante. Uma nave espacial. Caravelas chegando em solos não civilizados.

Lá vem o avatar do novo Salvador. Vem com a promessa de trazer alegria, uma bola de futebol de verdade para os meninos brincarem, presentes deixados sorrateiros nas portas dos casebres simples de gente humilde. Os olhinhos brilham, os queixos caem.

E os olhos do telespectador também se enchem de lágrimas. Que lindo a Coca-Cola chegar onde governos não chegam, lembrar dos esquecidos, levar um Feliz Natal aos ignorantes, é como aplaudem mensagens virais nas redes sociais.

Meus olhos também brilharam de lágrimas, mas lágrimas de tristeza. Será que mais alguém enxergava a violência daquela ação? Uma empresa de refrigerantes, uma potência mundial obesificante, que penetra em culturas tão particulares, quase intocadas, incute uma marca na cabeça de crianças, se aproveitando de sua inocência, de seus universos lúdicos tão ricos e diversos do que nos aculturamos com a cultura americana, trazendo referências tão distantes de suas realidades, e na sua exuberância fabricada, fabrica a ideia de sua superioridade colonizadora.

Já quando partem, deixam no vilarejo a concretude da noção do abandono. Sou eu quem trago a felicidade. Sou eu quem traz a magia. Acredite! Com comando imperativo, do alto de sua soberba, não percebe porém, que em meio a tantas agruras, a magia sempre esteve ali.