A quem interessa mudar a lei do PNAE? 
A quem interessa tirar a prioridade de aquisição de povos indígenas,  quilombolas e assentados/as da reforma agrária? 
A quem interessa criar reserva de mercado e comprometer a qualidade da  alimentação escolar?

No dia 8 de junho de 2021, 40 movimentos sociais e organizações não governamentais, somadas  a seis Frentes Parlamentares, realizaram um ato virtual em defesa do Programa Nacional de  Alimentação Escolar (PNAE), que reuniu cerca de 800 participantes em uma sala de Zoom, e pouco  mais de 8.000 espectadores que assistiram ao ato nas redes sociais. O que motiva esta ampla  mobilização é o posicionamento contrário a uma série de projetos de Lei (PLs) que tramitam  no Congresso Nacional e que ameaçam o PNAE, comprometem a autonomia dos estados e  municípios, dos/as nutricionistas responsáveis técnicos/as e retiram de cena protagonistas  importantes como indígenas, quilombolas e assentados/as da reforma agrária na aquisição de  alimentos. As mudanças propostas tornam o PNAE vulnerável aos múltiplos interesses de grandes  produtores, da indústria de alimentos e das grandes redes de supermercados, ferindo frontalmente  a garantia da alimentação adequada e saudável, que respeita a produção sustentável, a cultura e  os hábitos alimentares saudáveis.  

O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é uma política pública fundamental para a  promoção da segurança alimentar e nutricional, reconhecida internacionalmente por garantir  comida saudável no prato de mais de 40 milhões de estudantes em todo o Brasil. Existe há quase  70 anos, mas somente em 2009, por meio da Lei 11.947, é que os/as agricultores/as familiares,  assentados/as da reforma agrária, povos indígenas e comunidades remanescentes de quilombos  passaram a ter prioridade na venda de sua produção para alimentar os/as estudantes. Foi também  no período mais recente que se aperfeiçoaram os cardápios em prol de uma alimentação pautada  pela cultura alimentar e produção local, sustentabilidade, sazonalidade e diversificação. Estas  conquistas levaram a uma significativa melhora na qualidade da alimentação e na dinamização das  economias locais, fortalecendo sistemas alimentares saudáveis e sustentáveis.  

Com a pandemia, as aulas presenciais foram suspensas, e a oferta das refeições nas escolas,  interrompida. Nesta ocasião, o Congresso Nacional tomou a importante decisão de autorizar a  distribuição de kits/cestas de alimentos do PNAE às famílias dos/as estudantes, através da Lei nº  13.987/2020. 

O Congresso Nacional sempre esteve ao lado da Alimentação Escolar, mas neste momento a  virtuosa lei que rege o programa está ameaçada por PLs que tramitam tanto na Câmara dos  Deputados quanto no Senado. Não há dúvidas quanto a intenção de setores econômicos em  acessar este mercado governamental, que adquire anualmente, apenas com recursos do  Governo Federal, cerca de R$ 4 bilhões em alimentos, em todo o território nacional.  

Por isso, apelamos para que modificações na legislação não aconteçam sem um amplo debate  com as representações dos diversos setores envolvidos com o PNAE, a exemplo da agricultura  familiar e camponesa, nutricionistas e gestores. As alterações propostas podem levar a retrocessos  que vão prejudicar a alimentação dos estudantes e os circuitos locais de produção e abastecimento.

ATENÇÃO, SENADORES/AS: rejeitem o PL 3.292/2020!!!!!!! 

Foi aprovado na Câmara dos Deputados, seguindo para o Senado, o PL 3.292/2020, de autoria do  deputado Major Vitor Hugo (PSL/GO). Este PL cria reserva de mercado para a compra de leite  fluido na alimentação escolar e retira a prioridade da aquisição de alimentos de povos indígenas e  comunidades quilombolas e assentados(as) da reforma agrária. Cabe destacar que tramitam no  Congresso Nacional mais de dez PLs de natureza similar, como o PL 4.195/2012 (que propõe a  obrigatoriedade de oferta da carne suína) e seus apensados, e o PL 1.466/2021 (que torna  obrigatória a oferta diária de feijão e arroz em pelo menos 50% das refeições servidas no âmbito  do PNAE).  

Dizemos não ao PL 3.292/2020, e a outros projetos similares, porque: 
  1. NÃO SE DEVE CRIAR RESERVAS DE MERCADO NA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR.
    A criação  de uma cota para a compra de leite fluido cria um perigoso precedente de reserva de mercado,  tornando o PNAE vulnerável aos múltiplos interesses e lobbies da indústria de alimentos, que veem  no programa um canal de escoamento de seus produtos;
  2. A AGRICULTURA FAMILIAR NÃO SERÁ BENEFICIADA.
    Quem fornece majoritariamente leite  fluido ao PNAE não são os/as agricultores/as familiares, e sim, laticínios de médio e grande porte.  Neste sentido, o argumento central de favorecimento da agricultura familiar não se sustenta;
  3. ESTADOS E MUNICÍPIOS DEVEM TER AUTONOMIA PARA DECIDIR O QUE COMPRAR  PARA A ALIMENTAÇÃO A ESCOLAR.
    Ao transferir a responsabilidade de definição do cardápio  para o Congresso Nacional, é ferida a autonomia de estados e municípios na definição da compra  e dos cardápios, que devem ser pautados pela oferta local, sazonalidade, diversificação agrícola  da região e na promoção da alimentação adequada e saudável, e elaborado por nutricionistas;
  4. ÓRGÃOS FEDERAIS JÁ SE POSICIONARAM CONTRA CONSIDERANDO A VIABILIDADE  TÉCNICA E OPERACIONAL.
    A Comissão de Educação da Câmara dos Deputados votou pela  rejeição, sendo esse também o posicionamento oficial do próprio Fundo Nacional de  Desenvolvimento da Educação (FNDE/MEC), Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA), da Casa  Civil, e do Ministério Público Federal;
  5. LOGÍSTICA E VIABILIDADE OPERACIONAL DEVEM SER LEVADAS EM CONSIDERAÇÃO  PARA A COMPRA DA ALIMENTAÇÃO ESCOLAR.
    Muitas escolas, especialmente em municípios de menor porte, não possuem condições adequadas para o armazenamento do leite fluido;
  6. ALIJAM AS COMUNIDADES INDÍGENAS E GRUPOS TRADICIONAIS ESPECÍFICOS E VÃO  TRAZER SÉRIOS EFEITOS PARA A SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL DESSAS  COMUNIDADES.
    Ao retirar a prioridade de aquisição concedida aos assentamentos da reforma  agrária, comunidades indígenas, quilombolas e tradicionais, os PLs ampliam sua exclusão do  acesso aos mercados e às políticas públicas, além de prejudicar sua cultura alimentar e promover  ainda mais a desnutrição destes povos. Em Nota Técnica, a Funai avalia como fundamental  considerar, no âmbito da alimentação escolar indígena e de comunidades tradicionais, o respeito  aos costumes e características de suas culturas, bem como o contexto de autoconsumo;
  7. O PNAE É UM PROGRAMA DA EDUCAÇÃO QUE CUMPRE PAPEL CENTRAL NA AGENDA  DE SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL E EDUCAÇÃO. O FNDE É O ÓRGÃO  COMPETENTE PARA REGULAMENTAR E MONITORA-LO.
    Ao retirar a designação FNDE/MEC da regulamentação da aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar, o PL 3.292 soma se a uma série de outros ataques legislativos que tentam fragilizar esta instituição tão importante  para a coordenação nacional e intersetorial do PNAE. 

Mais argumentos técnicos podem ser conhecidos em Nota Técnica produzida pelo Observatório da  Alimentação Escolar. 

ATENÇÃO DEPUTADOS: Rejeitem o PL 284/2021!!!!!!!! 

Este PL, de autoria da deputada Luísa Canziani (PTB/PR), prevê que durante o período de  suspensão das aulas presenciais, em razão de situação de calamidade pública, possa haver não  apenas a distribuição de gêneros alimentícios diretamente às famílias, mas, de modo alternativo, a  distribuição de recursos financeiros. Nos opomos a esta proposta por avaliar que o tema da  distribuição de alimentos durante a pandemia já está devidamente disciplinado pela Lei nº  13.987/2020, que permitiu a distribuição apenas de gêneros alimentícios, e não a utilização de  “cartões alimentação”. Cabe lembrar que este tema já foi exaustivamente debatido na Câmara dos  Deputados, tanto na tramitação da MP nº 934/2020, quanto na tramitação do PL nº 2159/2020,  sendo rejeitado. Qualquer nova proposta de alteração proveniente deste PL e seus apensados deve  seguir os ritos de passagem pelas comissões e os debates com a sociedade.  

Dizemos não ao PL 284/2021, porque: 
  1. A DISTRIBUIÇÃO DE CESTAS DE ALIMENTOS É A MAIS ADEQUADA PARA A GARANTIA  DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO.
    Se tomado como base o recurso per capita (no  Ensino Fundamental, por exemplo, é de R$ 0,36 por dia letivo), o valor passível de ser  transferido seria de apenas R$ 7,20 por mês. Estes valores, fora da dinâmica das compras  públicas, não são suficientes para garantir segurança nutricional dos estudantes durante um  mês;
  2. A TRANSFERÊNCIA FINANCEIRA INTERROMPE AS COMPRAS DA AGRICULTURA  FAMILIAR.
    Isso coloca em risco a produção e compromete a renda de pequenos as  agricultores/as, que dependem deste canal de comercialização para seu sustento, o que tende  a aumentar a pobreza no campo, já acentuada pela pandemia da Covid-19, contexto no qual,  de um total de 19 milhões de pessoas passando fome, 12% são da área rural (Vigisan) ;
  3. FAVORECE O CONSUMO DE ALIMENTOS ULTRAPROCESSADOS E A COMPRA EM  GRANDES REDES DE SUPERMERCADO.
    A operacionalização dos recursos do PNAE por  empresas de “cartão alimentação”, que podem ser utilizados apenas em rede cadastrada de  supermercados, tende a centralizar nas grandes redes de abastecimento e na aquisição de  alimentos ultraprocessados o orçamento destinado à alimentação escolar. Esta mudança vai na  contramão das diretrizes do programa, que favorecem as compras locais da agricultura familiar  e a garantia de oferta de uma alimentação saudável e adequada. Não há dúvidas quanto ao  interesse destas empresas e da indústria de alimentos em acessar este bilionário mercado  institucional, através de modelos de gestão que já estão sendo incubados em prefeituras de  grandes capitais. 

Em 16 de junho de 2021, assinam esta carta: 

ACT Promoção da Saúde 

Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável 

Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA Brasil) 

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) 

Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) 

Campanha Nacional pelo Direito à Educação  

Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e pela Vida 

Comissão Pastoral da Terra (CPT) 

Confederação Nacional dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares (CONTAG) Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) Confederação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Brasil (CONTRAF  Brasil) 

Conselho Federal de Nutricionistas (CFN) 

Colegiado Nacional de Presidentes e Presidentas dos CONSEAs Estaduais (CPCE) Conselho Indigenista Missionário (CIMI) 

Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil (FEAB) 

Federação Nacional dos Nutricionistas (FNN) 

FIAN Brasil – Organização pelo Direito Humano à Alimentação e à Nutrição Adequadas Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional 

Frente Parlamentar de Segurança e Soberania Alimentar e Nutricional 

Frente Parlamentar Mista da Agricultura Familiar 

Frente Parlamentar Mista em Defesa das Comunidades Quilombolas 

Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas 

Frente Parlamentar pelo Desenvolvimento da Agroecologia e Produção Orgânica Frente Parlamentar em Defesa da Convivência com o Semiárido 

Frente Parlamentar em Defesa dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável 

Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) 

Movimento Camponês Popular (MCP) 

Movimento de Mulheres Camponesas (MMC) 

Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP) 

Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) 

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) 

Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) 

Movimento Geraizeiro 

Movimento Nacional pela Soberania Popular Frente à Mineração (MAM) 

Núcleo Agrário do PT 

Observatório da Alimentação Escolar 

Rede de Povos e Comunidades Tradicionais do.Brasil 

União Nacional das Organizações Cooperativistas Solidárias (UNICOPAS) 

World Wildlife Fund (WWF Brasil)